A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, de forma unânime, que o consumidor vítima de golpe bancário não pode ser responsabilizado parcialmente pelos prejuízos quando o golpe decorre de falha no sistema de segurança do banco. A decisão foi proferida no julgamento do Recurso Especial n.º 2.220.333, e noticiada no portal STJ Notícias.
A chamada culpa concorrente ocorre quando tanto o autor do dano quanto a vítima contribuem, de alguma forma, para o resultado prejudicial — ou seja, quando se entende que ambos têm parte de responsabilidade pelos prejuízos. No caso analisado pelo STJ, porém, o Tribunal concluiu que a consumidora não teve qualquer participação consciente na ocorrência do golpe, afastando assim essa hipótese.
O caso julgado pelo STJ
Uma cliente de instituição financeira foi induzida por um criminoso, que se passou por funcionário do banco, a instalar um aplicativo em seu celular com o falso pretexto de aumentar a segurança da conta. A partir desse acesso remoto — conhecido como “golpe da mão fantasma” — o fraudador contratou um empréstimo de R$ 45 mil e realizou diversas transações incompatíveis com o perfil da consumidora.
Em primeira instância, o banco foi condenado a restituir integralmente o valor. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), porém, reconheceu a chamada culpa concorrente da vítima e reduziu a indenização pela metade. O caso chegou ao STJ por meio de recurso da consumidora.
A decisão do STJ
O relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, destacou que os bancos possuem dever de segurança na prestação dos serviços e devem adotar mecanismos eficazes para identificar e coibir fraudes, inclusive aprimorando-os de forma contínua.
Segundo o ministro, quando a instituição valida operações suspeitas e fora do perfil habitual do cliente, há defeito na prestação do serviço, o que atrai a responsabilidade objetiva do banco, conforme prevê o Código de Defesa do Consumidor.
O STJ também afastou a tese de culpa concorrente da vítima. Para que essa hipótese se aplique, é necessário que o consumidor tenha consciência e aceite o risco de sofrer o dano — o que não ocorre quando a pessoa é enganada por um golpe de engenharia social, acreditando se tratar de um contato legítimo do próprio banco.
Nas palavras do relator, “o acesso de terceiros a aplicativos e senhas pessoais não ocorre por falta de cautela dos correntistas, mas em virtude de fraude contra eles cometida”. Por isso, o Tribunal entendeu que a instituição financeira deve ressarcir integralmente o prejuízo causado à cliente.
Aspectos jurídicos relevantes do julgamento
O caso se baseou na interpretação dos artigos 944 e 945 do Código Civil, que tratam da reparação dos danos e da possibilidade de redução da indenização em caso de culpa concorrente. O STJ reafirmou que essa redução deve ser interpretada de forma restritiva, sendo cabível apenas quando a vítima contribui conscientemente para o dano.
A decisão também fez referência aos Enunciados 46 e 380 do Conselho da Justiça Federal (Jornada de Direito Civil), que reforçam que a mitigação da indenização é exceção e deve observar o princípio da reparação integral.
O que essa decisão representa para o consumidor
O julgamento reforça um entendimento importante: as instituições financeiras respondem integralmente por falhas em seus sistemas de segurança, inclusive por fraudes decorrentes de golpes de engenharia social.
O consumidor, por sua vez, não pode ser penalizado por ter sido vítima de uma fraude sofisticada, quando não há indícios de que tenha agido com negligência consciente.
Em outras palavras, o STJ reforça que o dever de segurança é parte essencial da relação bancária e que o risco das atividades financeiras não pode ser transferido ao consumidor.
Conclusão
A decisão do STJ no REsp 2.220.333 consolida uma proteção importante ao consumidor e reforça a responsabilidade objetiva das instituições financeiras em casos de golpes e fraudes bancárias.
Em situações semelhantes, é fundamental buscar orientação jurídica de um advogado de confiança, que poderá analisar o caso concreto e indicar as medidas cabíveis para resguardar seus direitos.
Fonte: STJ Notícias — Recurso Especial n.º 2.220.333, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 2025.